Vale a pena vender mais a qualquer preço?

qualquer preçoEm tempos de recessão, o varejo precisa adotar estratégias para não sacrificar o valor dos produtos que comercializa

Quando o assunto é preço, o que é melhor? Reduzir para vender mais em relação aos concorrentes ou cobrar um valor que assegure rentabilidade e margem de lucro para a empresa?

O fato é que ambas as alternativas, que podem render uma boa conversa entre profissionais de marketing e de finanças, têm de estar cada vez mais afinadas no plano estratégico de formação de preço dos produtos no varejo.

Mesmo na crise, nem todo produto pode permanecer em promoção nas lojas – e para cada tamanho de empresa haverá uma política de formação de preço.

“Neste caso, não há como generalizar”, afirma Nelson Bruxellas Beltrame, engenheiro, sócio-diretor da Data Custos e professor do MBA de educação executiva da FIA e Fipecafi -que nesta quarta-feira (21/09), discorre sobre gestão estratégica de preços no varejo e análise de cadeias de distribuição em evento na Associação Comercial de São Paulo (ACSP).

Ele conta que os modelos matemáticos voltaram para a mesa na hora de formar preço, assim como era de praxe na década de 80, quando a inflação no país era galopante e a economia, instável.

Beltrame explica que durante os anos de crescimento da economia -iniciados a partir do Plano Real- o ambiente de consumo era crescente, o que fez com que conceitos de marketing ganhassem força na formação de preços, em sintonia com o comportamento do consumidor e a concorrência.

Com isso, os preços e a margem de lucro das empresas no Brasil chegaram a um patamar elevado.

“A necessidade de modelos matemáticos foi deixada de lado porque o mercado crescia. Os preços subiram muito em um mercado crescente, no qual a população enriquecia e consumia mais. O ciclo de crescimento terminou no ano passado com os preços em alta e o efeito foi devastador no varejo.”

Por isso, segundo ele, esses modelos voltam a ganhar força agora. Com a recessão, ele defende que seja qual for o porte da empresa, ela precisará fazer um bom planejamento estratégico de preços e promoções para evitar o “suicídio” do valor dos produtos.

“A promoção se tornou a nova normalidade durante a crise. E o resultado foi o fechamento de muitas lojas”.

Para Beltrame, o varejista deve considerar a importância da rentabilidade na precificação e evitar a máxima de que a melhor forma de vender é baixar o preço – apenas.

“Ele pode quebrar mais rápido. Para evitar isso, precisará adotar uma visão de mercado e de marketing junto com a financeira, porque o consumidor ainda escolhe o que comprar pelo preço na vitrine”, diz.

Segundo o especialista, a margem de lucro é o principal fator que eleva os preços no Brasil, seguido pela carga tributária e o custo financeiro do financiamento para o consumidor. “O produto parcelado tem um custo elevado de financiamento que pode representar 20% do preço”, afirma.

 

TEM E-COMMERCE? CUIDADO COM OS BUSCADORES DE PREÇOS!

Beltrame diz que é suicidio usar buscadores de preços se a loja virtual não tiver base econômica. Em outras palavras: ao reduzir o valor por causa do concorrente, esquece que pode estar brigando com empresas de diferentes regimes de tributação e estrutura de custos – que por esse mesmo motivo conseguem praticar preços agressivos.

“Acompanhar o preço do mercado é complexo, para não dizer perigoso. É como disputar uma corrida de cavalos em cima de um cavalo dopado. Quem baixa sem critério corre o risco de ter de bater na porta do fornecedor para repassar o problema do baixo preço”, afirma.

O lojista, nesse caso, deve saber o preço mínimo pelo qual pode vender o produto e não deixar essa definição no modo automático do robô.

Ele defende uma visão crítica em relação aos buscadores de preços, principalmente depois que a PEC do setor eletrônico entrou em vigor, no início deste ano.

Até 2015, a cada venda pela internet o lojista pagava ICMS de acordo com o estado em que estava localizado o seu comércio.

A nova lei estabelece que ele deve pagar o imposto de acordo com o estado de destino do produto, o que atingiu empresas que haviam se instalado em estados que cobram uma alíquota menor do imposto para oferecer um preço mais competitivo.

Por força de uma liminar, a medida não vale para empresas vinculadas ao Simples.

“Então, o que ocorria é que o mercado corria atrás do preço da empresa com carga tributária menor. Com essa mudança de regra, muitas tiveram que elevar os preços em um momento ruim de mercado. Isso tem afetado a rentabilidade”, afirma.

 

NÃO PRECIFIQUE SEM ANTES CALCULAR

Mesmo com boa vontade é difícil precificar um a um todo os itens de uma loja. Por isso, o uso de sistemas para a formação de preços é importante – até mesmo para pequenos negócios.

O que não é mais possível é fazer a velha conta simples de padeiro para definir valores. “Não se deve trabalhar com preços sem ter embasamento.

Quanto menor a operação for, mais perigoso fica”, afirma. Se o grande varejo tem áreas específicas para cuidar disso, os pequenos e médios podem lançar mão de ferramentas livres e disponíveis no mercado para, de acordo com o especialista.

 

PROMOÇÃO NÃO É PARA TUDO, NEM PARA TODOS

Com o preço formado corretamente, é preciso planejar as promoções. “O setor de moda têxtil e calçadista é muito bom nisso. Eles lançam coleções com um preço que já inclui a previsão de promoção, ou seja, de um valor que tornará o produto mais atrativo para o cliente no futuro.

Um exemplo disso em moda é o produto de uma nova coleção lançado a 200% de seu valor, que cai para a metade em uma liquidação.

“Após essa redução o mark-up dele é de 1,3%. Isso mostra que é melhor vender do que deixar na loja”. O mark-up é um índice que mostra quanto do preço do produto está acima do seu custo de produção e distribuição.

 

CUIDADO COM A DESTRUIÇÃO DE VALOR

O que se deve evitar, de acordo com o especialista é tornar a promoção o “novo normal” da loja, porque isso gera a destruição do conceito de valor de certos produtos.

“O consumidor está retraído, mas o lojista deve saber a qual categoria de produto ele está mais sensível quando o assunto é o custo. Geralmente são os básicos”, diz.

Ele defende que produtos do segmento premium e de luxo não devem ter o preço sacrificado.

Beltrame diz que esse não é um problema exclusivo do varejo, mas também da indústria, que na precificação ainda tenta entender o mercado para direcionar o valor do produto.

O especialista diz que promoções excessivas destruíram o valor de produtos de algumas marcas que fazem parte da linha cinza -que são os eletroportáteis de valor acessível.

“São produtos como liquidificador e ventilador que não tinham preços muito altos, mas geravam um valor competitivo de marca. Os preços foram cedendo e, agora, as marcas não conseguem recuperá-los. O liquidificador é um exemplo de produto que foi caro e hoje é barato. Apenas o da linha premium manteve o seu valor. Isso é exemplo de suicídio de valor”.

 

Autor: Rejane Tamoto

Fonte: Diário do Comércio

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